abril 11 2024

STF cassa decisão da Justiça do Trabalho por violação à Cláusula de Reserva de Plenário e à Súmula Vinculante 10

Share

Em 05/04/2024, o STF, ao decidir uma Reclamação Constitucional, ratificou a imperatividade do artigo 97 da Constituição Federal e da Súmula Vinculante 10, cassando um acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, por meio do qual havia sido afastada a aplicação do artigo 82-A da Lei 11.101/2005 (Lei de Falências).

Background

A Constituição Federal é a base do ordenamento jurídico do nosso país e deve ser observada por todos. O cumprimento das normas constitucionais garante a segurança jurídica, a proteção dos direitos fundamentais e a validade das demais normas. Nesse sentido, é indispensável que juristas, magistrados e demais atores do sistema jurídico atuem de acordo com os princípios e dispositivos estabelecidos na Constituição Federal, assegurando a coerência e a estabilidade do sistema jurídico brasileiro.

Em matéria de controle de constitucionalidade, o Brasil adota um sistema misto, abrangendo o controle concentrado, que, no que diz respeito à Constituição Federal, é realizado apenas pelo STF, e o controle difuso, de origem norte-americana.

O controle difuso de constitucionalidade pode ser realizado por qualquer juiz ou tribunal, sendo que, no caso dos tribunais, incide a Cláusula de Reserva de Plenário, prevista no artigo 97 da Constituição Federal, a qual dispõe que determinada norma somente poderá ser declarada inconstitucional de forma incidental se tal decisão for proferida pela maioria absoluta dos membros do tribunal ou de seu órgão especial.

Provocado a se manifestar sobre o tema em diversas oportunidades (RE 240096, RE 319181, RE 544246, AI 472897 AgR e RE 482090), o STF, em 2008, editou a Súmula Vinculante 10, a qual dispõe que decisão de órgão fracionário de tribunal que afaste a incidência de uma norma, mesmo sem expressamente declará-la inconstitucional, viola a Cláusula de Reserva de Plenário.

Decisão do STF

Apesar de a Súmula Vinculante 10 ter sido editada pelo STF há mais de 15 anos, ainda há magistrados que deixam de observá-la e advogados que deixam de arguir sua aplicabilidade, especialmente no âmbito da Justiça do Trabalho.

Essa inércia jurídica infelizmente permite que decisões teratológicas sigam produzindo efeitos, sem que o STF tenha a possibilidade de intervir. Eventualmente, entretanto, indivíduos e sociedades empresárias afetados por decisões dessa natureza conseguem levá-las ao conhecimento da Suprema Corte, a qual pode cassá-las.

Foi o que ocorreu na última sexta-feira. No caso levado ao STF, um indivíduo foi notificado, pela Justiça do Trabalho de São Paulo, a responder a um incidente de desconsideração da personalidade jurídica da massa falida de uma sociedade empresária.

Ao se defender, o empresário suscitou a incompetência da Justiça do Trabalho para julgar a questão, por força do artigo 82-A, parágrafo único, da Lei de Falências, o qual dispõe que “a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade falida, para fins de responsabilização de terceiros, grupo, sócio ou administrador por obrigação desta, somente pode ser decretada pelo juízo falimentar”.

A Vara do Trabalho na qual o processo tramita, entretanto, afastou a incidência do referido dispositivo legal, sob a alegação de que o Tribunal Superior do Trabalho entende que a competência é da Justiça do Trabalho. A 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, por sua vez, manteve a decisão.

Em reclamação ao STF, o empresário argumentou que a 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, violando a Súmula Vinculante 10, afastou a incidência do artigo 82-A da Lei de Falências, tendo declarado indiretamente a sua inconstitucionalidade, sob o argumento de que, apesar do disposto na norma, a declaração de competência da Justiça do Trabalho não violaria a lei, nem implicaria usurpação de atribuições do juízo falimentar.

Ao acolher a reclamação, o Ministro André Mendonça ressaltou, em sua decisão, que a 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, apesar de não ter declarado expressamente a inconstitucionalidade do artigo 82-A da Lei de Falências, esvaziou o seu conteúdo e eliminou as suas hipóteses de incidência, violando a Súmula Vinculante 10, por inobservância da Cláusula de Reserva de Plenário.

Conclusão

De acordo com o Ministro Gilmar Mendes, das 4.781 reclamações constitucionais recebidas pelo STF em 2023, mais de metade (2.566) desafia decisões da Justiça do Trabalho.

O número até parece excessivo, mas ainda está sujeito a uma ampliação nos próximos anos, especialmente se os indivíduos e as sociedades empresárias, devidamente assessorados por profissionais tecnicamente capazes de adequadamente utilizar os instrumentos que a legislação fornece, obtenham êxito em levar mais casos para análise do STF, por meio de reclamações constitucionais bem construídas e fundamentadas e com a utilização de recursos extraordinários elaborados com a mesma meticulosidade técnica.

Eventual movimento nesse sentido, apesar de elevar o número de processos no STF em um primeiro momento, não seria nocivo. Ao contrário, a sistemática adoção de técnicas jurídicas adequadas para levar determinadas discussões aos tribunais superiores pode estimular a Justiça do Trabalho a rever alguns de seus posicionamentos históricos e a adotar precauções adicionais em suas decisões, evitando, por exemplo, novas violações à Cláusula de Reserva de Plenário e ao disposto na Súmula Vinculante 10.

O time Trabalhista e Previdenciário do Tauil & Chequer Advogados associado a Mayer Brown está à disposição para auxiliar as empresas no esclarecimento de dúvidas relacionadas ao tema.

Serviços e Indústrias Relacionadas

Stay Up To Date With Our Insights

See how we use a multidisciplinary, integrated approach to meet our clients' needs.
Subscribe